Pseudopapel

O fim da Ponte Orca

Bilhetes da Ponte Orca

Hoje São Paulo tem poucas estações de transferência em sua rede de transporte metropolitano, mas tem cinco a mais, em funcionamento total ou parcial, do que em agosto de 2000. Nessa época o Metrô tinha apenas Sé, Paraíso e Ana Rosa — situação, aliás, que ainda levaria uma década para mudar, com a inauguração, em maio de 2010, da integração entre a Estação Consolação e a recém-inaugurada Estação Paulista. Na CPTM, apenas Barra Funda, Osasco, Presidente Altino, Brás, Tatuapé, Corinthians-Itaquera e Calmon Viana (a Luz estava passando por uma grande reforma). Transferências do Metrô para a CPTM e vice-versa, apenas na Barra Funda e no Brás de maneira gratuita, com Tatuapé e Corinthians-Itaquera oferecendo integração tarifada. No horizonte, apenas a Linha 5-Lilás, que seria inaugurada em outubro de 2002, sem chegar, no entanto, a cruzar com outras linhas do Metrô. Uma nova estação nas linhas já existentes? A Estação Vila Olímpia, na Linha 9 da CPTM, seria inaugurada em maio de 2001, mas, depois dela, apenas a Estação Chácara Klabin, exatos cinco anos depois.

Mapa da rede de transporte metropolitano paulista em 2000

Diante desse cenário, reproduzido no mapa acima, e da falta de perspectiva de novas conexões no sistema, surgiu a ideia de criar um serviço de micro-ônibus ligando estações razoavelmente próximas, batizado de Ponte Orca. Orca é Operador Regional Coletivo Autônomo. Assim, em 28 de agosto de 2000 surgiu a primeira Ponte Orca, servindo as estações Vila Madalena, na Linha 2-Verde, e Cidade Universitária, na então Linha C-Celeste (atual Linha 9-Esmeralda). Um folheto distribuído à época apregoava as vantagens do serviço, como a gratuidade. E avisava: “Quem não usava trem metropolitano ou Metrô agora tem o benefício de viajar nos dois, pagando apenas um bilhete.” Na Estação Vila Madalena, o embarque era feito das 5 horas às 23h40; na Estação Cidade Universitária, das 4h45 às 23h40. Três meses depois, em 27 de novembro, o serviço seria estendido à Estação Barra Funda, na Linha 3-Vermelha, que também ganharia ligação com Vila Madalena.

O funcionamento era bem simples: antes de sair pelos bloqueios da estação (e isso era algo bastante enfatizado na comunicação do serviço), era necessário pegar um bilhete gerado numa máquina próxima às catracas. Ele continha um código de barras que valia por uma hora e era lido nas catracas da estação de destino, liberando a passagem. Eventualmente o leitor do código de barras tinha algum problema, e funcionários do Metrô trocavam os bilhetes com códigos de barras por bilhetes comuns. Como muitos não chegavam a utilizar a segunda parte do trajeto ferroviário, quando as vans estacionavam no destino várias pessoas se aglomeravam em volta pedindo bilhetes que não seriam utilizados. Não era nada raro que conseguissem, apesar do aviso nos bilhetes: “Senha de uso pessoa e intransferível.”

A primeira vez que utilizei a Ponte Orca foi no segundo semestre de 2003, quando comecei a jogar futebol em Santo Amaro. Eu saía do escritório onde trabalhava, próximo à Estação Trianon-Masp, seguia até Vila Madalena, onde pegava a Ponte Orca até Cidade Universitária, e de lá até a Estação Morumbi. Voltei a usar periodicamente o serviço a partir de setembro de 2005 por quase um ano, entrando nos finais de tarde na Estação Cidade Universitária para pegar o bilhete da Ponte Orca e seguindo para a Linha 2-Verde. Na época, a fila se iniciava no ponto ao lado da saída das escadas, do outro lado da Marginal Pinheiros, serpenteava um pouco pela calçada e subia as escadas. Não raro, peguei a fila próximo às catracas. Uma ou outra vez a fila tinha de serpentear bastante pelo saguão ali, para abrigar tanta gente. Apesar de quase sempre comprida nos horários de pico, a fila costumava andar razoavelmente rápido. O bilhete expirava uma hora após sua emissão, mas nunca cheguei a ver um expirar por causa da fila.

Saída da antiga Estação Tamanduateí na Rua Vemag

Já a Ponte Orca que ligava a antiga Estação Tamanduateí à Estação Alto do Ipiranga, a partir de fevereiro de 2008, e depois à Estação Sacomã a partir de fevereiro de 2010, essa eu nunca usei. No último dia de funcionamento da antiga Estação Tamanduateí, passei ao lado da fila que se formava pela última vez ao lado da estação, como mostra a foto acima. Aliás, não só ao lado: ela adentrava a estação e tomava conta da plataforma no sentido Luz. A inauguração da nova Estação Tamanduateí, integrando Metrô e CPTM, decretou que a Ponte Orca só funcionaria ali enquanto a nova estação não funcionasse em horário integral. Quando ela passou a funcionar das 4h40 às 21 horas, em março último, o serviço de micro-ônibus ficou limitado ao horário entre as 21 horas e as 22h30. Em junho passado a Estação Pinheiros da Linha 4-Amarela, que tem integração com a Linha 9-Esmeralda, passou a funcionar no mesmo horário, e a Ponte Orca também se espremeu naquela hora e meia noturna para o trajeto Cidade Universitária–Vila Madalena.

O último dia de funcionamento foi 9 de setembro, uma sexta-feira. Como já vinha sendo a norma, o serviço operou apenas das 21 horas às 22h30. A partir da segunda-feira 12 a Estação Pinheiros passaria a funcionar em horário integral de segunda a sábado, tornando a ligação por micro-ônibus desnecessária. Não houve comemoração, não sei que tipo de despedida houve. Na própria sexta-feira, a notícia não mereceu mais do que uma nota de quinze linhas no pé da página 6A do Jornal da Tarde. A Ponte Orca só não foi extinta porque ainda serve de ligação entre a Estação Jabaquara e o Zoológico, embora essa viagem seja tarifada.

4 comentários

Zé Maria Aquino (67)

A região onde moro, Brooklin, Moema etc começa a virar canteiro de obras. Tomara que as construções dessas novas linhas – Lilás – sejam rápidas e compensem os transtornos. Se tivessem olhado para o metro ao invés de só pensarem em avenidas…abração

26 de setembro de 2011, 10:26

Alexandre Giesbrecht

É, caro Zé Maria, se os planos originais do Metrô tivessem sido cumpridos, mesmo que com alguma lerdeza, hoje estaríamos falando em mais do que as cinco linhas de Metrô que temos. Mas duvido que as obras sejam rápidas. Nenhuma tem sido. Desde as fases de projetos até as respectivas construções, tudo quanto é prazo tem estourado. Antes tarde do que nunca?

26 de setembro de 2011, 20:59

Thiago Leal (9)

Comentário meio besta mas muito legal o bilhete da O.R.C.A. com uma orca!

(No meu mundo ideal, a desativação de um serviço público valeria no mínimo uma matéria decente antecedendo a desativação, não uma nota vagabunda apenas informando o fato. A administração das linhas de metrô é do Governo do Estado?)

27 de setembro de 2011, 22:47

Alexandre Giesbrecht

Thiago, o bilhete com a orca “morreu” em algum ponto entre 2004 e 2005. Mas os ônibus seguiram com o logotipo em suas portas. Já a desativação em si provavelmente não ganhou atenção pois o serviço já funcionava apenas uma hora e meia por dia. Mas a mudanças de um serviço que ia do início da manhã até quase o final da noite para essa uma hora e meia diária não mereceu, ao menos que eu me lembre, nenhum destaque no noticiário. Eu mesmo não tinha ficado sabendo e, quando vi na Estação São Joaquim um cartaz avisando que a Ponte Orca funcionava das 21 horas às 22h30, achei estranho. Eu não tinha associado à abertura da integração das linhas 4 e 9 em Pinheiros. De repente em algum jornal que eu não leio falou alguma coisa a mais ou deu algum destaque. Ah, e respondendo a sua pergunta: Metrô e CPTM são administrados pelo estado.

28 de setembro de 2011, 21:03

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Quem?

Alexandre Giesbrecht nasceu em São Paulo, em abril de 1976, e mora no bairro do Bixiga. Publicitário formado pela Escola Superior de Propaganda e Marketing, é autor do livro São Paulo Campeão Brasileiro 1977 (edição do autor).

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