A praga do spam não é recente. Convive-se com ela há quase vinte anos, e são spams de todos os tipos. Vez por outra, aparece algum mais curioso, mas são ocasiões raras, não só porque esses spams curiosos são raros, mas também porque quem é que fica olhando a pasta de lixo eletrônico, para encontrá-los? O problema é que o sistema de detecção de spams não é tão eficiente como gostaríamos. Nos casos em que o spammer envia, de uma forma praticamente manual, suas porcarias, é razoavelmente fácil enganar o filtro.
Cito como exemplo a mania recente de corretores de imóveis: enviar spam aleatoriamente sobre seus “fantásticos” lançamentos imobiliários, contando, para isso, com a ajuda de bancos de dados de endereços vendidos ilegalmente. Já recebi emails com lançamentos “imperdíveis” em cidades muito distantes da minha. Ontem, mesmo, recebi um spam sobre um prédio que até fica em São Paulo, mas veja o primor do raciocínio que abre a mensagem, mantido aqui com todos os erros de português: “Faço um trabalho totalmente on-line, entendo que hoje , clientes com potencial de compra não tem tempo pára falar ao telefone, por isso, lhe escrevo para apresentar um projeto de Alto Padrão no Jardins onde a muito tempo não se lança nenhum empreendimento deste porte, há 7 minutos da Av.Paulista o Coração financeiro de São Paulo.”
Tive a impressão de já ter recebido anteriormente um spam desse mesmo corretor de nome curioso, porém, como não tinha certeza, simplesmente respondi, solicitando que meu endereço fosse retirado de sua lista de spam. Ele respondeu-me dizendo que o removeu. Possivelmente, ele removeu-o, de fato, mas quem garante que meu endereço não pipocará de novo em sua lista quando ele comprar um CD mais “atualizado”, no futuro?
Outro exemplo foi um email que recebi há cerca de dois meses, com o assunto “Contato – café”. Desempregado que estava na época, o assunto interessou-me, aliado ao pequeno trecho que era destacado na caixa de entrada: poderia ser alguém que tinha recebido o meu currículo e queria conversar. A primeira frase não deixava transparecer que era um spam: “Eu trabalho como Diretora (sic) de relacionamento da agência XXXX XXXXXXX, uma agência de marketing e comunicação digital.” Ou seja, minha ideia fazia sentido.
Porém, ao ler o restante do texto, percebi que era uma mera propaganda dos serviços da empresa, com um agravante: a maneira como foi enviado — spam — depunha fortemente contra esses serviços. Vejamos. Ela fala em uma “consultoria avançada onde nós pesquisamos e monitoramos consumidores e outros players (sic)“. Pois bem, essa tal “consultoria avançada” enviou emails aleatoriamente para supostos clientes, inclusive uma pessoa física desempregada, alardeando a suposta eficiência do serviço.
O texto prosseguia: “Nosso grande diferencial e excelência é exatamente o monitoramento das mídias sociais para gestão da reputação da marca e também para planejamento e execução de estratégias sociais para a geração da publicidade espontânea através de ações, campanhas, aplicativos, combinadas com inteligência de negócio.” Nesse ponto, ela até não errou tanto, afinal, esta postagem em meu humilde blogue não deixa de ser uma “publicidade espontânea”, ainda que negativa. Só não é mais negativa, aliás, porque optei por omitir nomes.
E ainda havia essa preocupante pérola: “Esse é um conceito novo, que tempos (sic) implementado em cases de sucesso, como [ela cita o nome de três grandes empresas].” Na mesma hora, já fiquei com medo de essas três grandes empresas usarem a mesma estratégia de spam para divulgar seus serviços. Ou seja, a tal diretora de Relacionamento conseguiu arranhar a imagem do que são provavelmente seus três maiores clientes.
Antes de encerrar com sua assinatura, que incluía uma quase antítese “Inteligência digital”, ela despede-se com a seguinte proposta: “Gostaria, conforme a sua conveniência, de agendar uma reunião de 20 ou 30 minutos para lhe apresentar pessoalmente esta proposta de valor para a sua marca e sua operação e claro aproveitar e tomar um café para trocarmos cartão de visita.” Fiquei tentado a aceitar seu convite, mas, como eu não tinha cartões de visita, justamente por estar desempregado, deixei para lá, já com a ideia de escrever este texto em algum momento.
(Duas semanas depois, ela enviou novamente o mesmo email, com uma ou outra diferença nos espaçamentos entre parágrafos, mas silenciou-se desde então. Nesse segundo email, ela abria com um “Solicito sua indicação para área responsável”, que só serviu para ressaltar a falta de “inteligência digital” da agência.)
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Alexandre Giesbrecht nasceu em São Paulo, em abril de 1976, e mora no bairro do Bixiga. Publicitário formado pela Escola Superior de Propaganda e Marketing, é autor do livro São Paulo Campeão Brasileiro 1977 (edição do autor).