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Os cadernos do Estadão

Cadernos do Estadão

Acabo de ler um comunicado interno do Estadão, publicado pelo Blue Bus, anunciando mudanças a partir do próximo dia 22. ” O jornal adotará a configuraçao de três cadernos, mais um suplemento”, escreveu Ricardo Gandour, diretor de Conteúdo do jornal. Note que são citados três cadernos por dia, além de um suplemento. E quais seriam esses três cadernos? “O primeiro caderno terá as editorias Política, Internacional, Metrópole (incluindo os temas da atual Vida) e Esportes. O segundo caderno trará Economia, Negócios e Tecnologia. O Caderno 2 amplia a cobertura de entretenimento e incorpora comportamento digital e literatura.”

Ou seja, o Estadão vai retroceder mais de vinte anos. Para quem não se lembra, não era nascido ou simplesmente não se importava, até 1991, o noticiário era concentrado em um ou dois cadernos. Até os anos 1980, a divisão entre os assuntos nem era lá muito clara, mas essa época eu não peguei (como leitor). O que peguei foi a época de poucos cadernos, o que fazia com que o caderno “Cidades” (atual “Metrópole”) fosse sempre fundido com o “Esportes”, a não ser aos domingos e às segundas-feiras. Assim, eu tinha de dividir o jornal com a minha mãe, que queria ler “Cidades”, enquanto eu queria ler “Esportes”. Adivinhe quem tinha a preferência? Em vez de poder levar o jornal comigo para a escola, às vezes, eu não podia nem lê-lo de manhã. Não creio que fosse só comigo que isso ocorresse.

Quando os dois cadernos passaram a ser separados — a não ser em épocas como pouca cobertura esportiva, como em fins de ano, quando eles voltavam a se fundir por alguns dias –, resolveu esse problema. E isso, pelo visto, vai durar até abril de 2013. Já não divido mais o jornal com minha mãe, mas divido-o com minha esposa. E o “Metrópole” é sua leitura preferida do jornal. Não poderemos mais ler o jornal juntos na mesa do café da manhã.

O Estadão já tinha matado, no ano passado, o Jornal da Tarde. Nesse processo, vi diminuída a cobertura esportiva a que eu tinha direito. No JT, eram, no mínimo, doze páginas diárias, o que equivaleria a seis páginas n’O Estado, mas este, em muitos dias, traz apenas quatro páginas. A diferença no número de páginas é pequena, mas, na cobertura dos times, é gritante: enquanto o finado trazia, em geral, duas páginas para cada um dos quatro grandes (o equivalente a uma página inteira do irmão mais velho), não raro vê-se no Estadão uma única matéria, que ocupa apenas um pedaço da página. Se forem diminuir ainda mais, vai começar a ficar injustificável minha assinatura.

Não nego que os jornais enfrentam inúmeros desafios hoje em dia, especialmente para se fortalecer entre o público jovem. Mesmo entre a minha geração, que já não é tão jovem assim, não é lá muito fácil encontrar alguém que assine jornal. Entre os oito amigos de colégio com quem ainda mantenho contato frequente, nenhum (!) assina um jornal impresso. Apenas dois deles o fizeram em algum momento de suas vidas adultas. Uma das coisas que atraem jovens (do sexo masculino) aos jornais é o caderno de esportes. Foi o que aconteceu comigo.

Atualmente, quase ninguém fica sabendo de um resultado de jogo pelos jornais. Acontece, ainda, comigo, quando acabo indo formir muito cedo, mas é raro. Além disso, 95% do noticiário diário esportivo publicado em impressos ocorreu até as 18 horas do dia anterior. Muitas vezes, o sujeito abre o jornal na parte de esportes e só depara com notícias que já lera na internet à noite. Esse é o maior problema, e não consigo entender como mesclar tudo no mesmo caderno vai resolver. Os jogos noturnos continuarão com uma cobertura parca, escrita às pressas, devido aos exíguos prazos de fechamento, e estes nem veem a internet com vantagem, pois os sites sempre querem publicar seus textos o mais rápido possível — ou seja, minutos após o encerramento da partida. Isso também não vai ser resolvido com os cadernos mesclados.

Essa questão dos três cadernos é um tendência recente nos Estados Unidos, onde alguns jornais chegaram ao extremo de cortar algumas edições. Sim, alguns jornais já não põem sua versão impressa para circular em determinados dias da semana. Quanto tempo até essa “inovação” chegar por aqui? Será que, quando chegar, eu ainda estarei assinando um jornal?

6 comentários

Jose M. Aquino (67)

Há poucos meses enterraram o JT, onde comecei. Será que o Estadão está indo pelo o mesmo caminho que foi o JB? Espero que não.

5 de abril de 2013, 18:03

Alexandre Giesbrecht

Não acredito que isso venha a ocorrer, ao menos não tão cedo. Mas estou sentindo que teremos conteúdo mais voltado para o digital que para o impresso, o que, para mim, é um erro.

5 de abril de 2013, 18:28

Alemão (1)

Prof. Wilson diria que vc só “se depara” se for no espelho. O correto é “deparar” apenas.

Bom artigo, by the way.

5 de abril de 2013, 23:46

Alexandre Giesbrecht

Putz, Alemão, você tem razão. Dessa eu não me lembrava, mas é isso mesmo. Abraço!

6 de abril de 2013, 8:49

Abel (5)

Com essas mudanças acabou a coluna quinzenal das segundas-feiras do Prof. José de Souza Martins? Adorava suas lembranças da cidade.

26 de maio de 2013, 16:22

Alexandre Giesbrecht

Oi, Abel. Pelo visto, sim. A última coluna dele que eu vi no impresso foi a de 15 de abril, uma semana antes da mudança. Na lista de colunas dele no site, há ainda uma de 4 de maio, um sábado, mas, se você olhar o link dela com atenção, verá que não está escrito “impresso”, como estava nos demais. E folheei toda a edição do dia 4, sem encontrar a coluna dele. Mais uma das perdas que eles nem se dão ao trabalho de informar.

27 de maio de 2013, 10:31

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Quem?

Alexandre Giesbrecht nasceu em São Paulo, em abril de 1976, e mora no bairro do Bixiga. Publicitário formado pela Escola Superior de Propaganda e Marketing, é autor do livro São Paulo Campeão Brasileiro 1977 (edição do autor).

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