O último desserviço que a atual onda do politicamente correto nos impingiu é o sumiço das sacolinhas plásticas dos supermercados do estado de São Paulo. Claro, a medida é apregoada pelos próprios estabelecimentos como um compromisso em prol do meio-ambiente, mas uma análise só um pouquinho mais detalhada já mostra que esse compromisso é unilateral: apenas por parte dos consumidores. Vejamos: no estado de São Paulo, eram distribuídos 6,6 milhões de sacolas por ano em supermercados, segundo números publicados pela Vejinha desta semana. Se cada uma delas custasse um centavo para cada estabelecimento, a economia anual para eles é de nada menos que 66 milhões de reais no estado. É bom lembrar que as sacolinhas nunca foram grátis; seu custo sempre esteve embutido nos preços dos produtos, desde quando elas ainda eram de papel. Mas não espere uma redução proporcional dos preços dos produtos. Essa diferença será embolsada como um aumento de lucros, às custas do povo, que aceita de bom grado em nome da ecologia.
E a ecologia, o que ganha? Quase nada. Como sabemos, uma sacola plástica por si só não contamina nada. É necessário que algum sem-educação a jogue na rua e/ou em lugares não-apropriados. E gente sem educação existe por aí aos montes. Esse pessoal não vai deixar de jogar lixo na rua só porque não há mais sacolinhas plásticas. Eles ainda vão ter garrafas PET, embalagens plásticas, papéis etc. Não vi os supermercados sequer mencionando alguma coisa sobre as garrafas PET, por exemplo (as mesmas que ainda poluem rios por todo o Brasil, apesar de o país ser campeão de reciclagem do item). Seria porque as garrafas PET são vendidas, ao contrário das sacolinhas, distribuídas “de graça”? Campanha de educação os supermercados nunca financiaram. Custa dinheiro, sabe? Os governos de todas as esferas também nunca se preocuparam muito com isso.
Eu sempre aprendi com meus pais que não devia jogar lixo na rua. Não jogo em hipótese alguma e já dei muita bronca em amigos que o fizeram na minha frente. Também já peguei muito lixo dos outros e joguei na lata, preferencialmente na frente da pessoa que jogou. Mas é algo quixotesco, cujo impacto é insignificante. Na minha casa, as sacolinhas de mercado sempre foram usadas para acumular os itens recicláveis, sendo depois depositadas na caçamba do prédio onde moro. Na lata de lixo vão sacos de lixo, supostamente apropriados para esse fim — não sou totalmente convencido de que eles são uma solução melhor que as sacolinhas de mercado. Mas, apesar de tudo isso, eu serei “punido” junto com os mal-educados.
Por ora, a “punição” foi adiada. O novo prazo para as sacolinhas sumirem é daqui a pouco menos de dois meses. Até lá, os supermercados estão proibidos de vender as sacolinhas ditas biodegradáveis e devem fornecer opções gratuitas aos clientes, nem que sejam as sacolinhas antigas. Você acha que as sacolinhas antigas voltaram aos caixas? Que nada! Cito dois exemplos.
Primeiro exemplo: no Pão de Açúcar próximo ao Alphaville 6, no último sábado 4, primeiro dia em que as alternativas gratuitas tinham sido impostas aos mercados, eu solicitei uma sacolinha. A caixa perguntou-me se eu queria comprar uma — algo que, eu descobriria depois, é vedado neste momento —, e eu respondi que não, eu queria uma sacolinha gratuita. Ganhei uma, mas só após a liberação da gerente, que controla a entrega das sacolinhas, dadas única e exclusivamente a quem solicita. Muitas pessoas lá estavam preparadas, com sacolas retornáveis, carrinhos etc. Mas muitas não estavam, e não lhes foi oferecida nenhuma opção.
Segundo exemplo: no dia seguinte fui ao Extra da Avenida Brigadeiro Luís Antônio, que é do mesmo grupo do Pão de Açúcar. A primeira coisa que me chamou a atenção foi o aviso ao lado das sacolinhas de frutas, em português com erros, dando conta que havia um limite de cinco sacolinhas por vez, e que elas deviam ser usadas exclusivamente para transportar frutas. Isso porque muita gente estava pegando um monte dessas sacolinhas para transportar suas compras após passar no caixa, apesar de elas serem difíceis de carregar por não terem alças. Haveria alguma punição? Será que proibiriam quem usasse saquinhos para “fins maléficos” de entrar no mercado? Será que o “infrator” seria preso? O aviso não deixava claro. No caixa, eu já tinha percebido que o esquema era similar ao do Pão de Açúcar: em vez de a gerente liberar as sacolas, as atendentes patinadoras (se não me engano, chamadas de fiscais de caixa) traziam algumas sacolas a tiracolo, fornecendo-as aos clientes que as solicitavam. Foi o que o consumidor à minha frente fez.
Na minha vez, entretanto, as sacolinhas demoraram para ser entregues após minha solicitação. Mais de cinco minutos. Então apareceu a patinadora, olhou para as minhas compras, que não eram muitas, e estimou que seriam suficientes três saquinhos. Sim, saquinhos. Veja na foto abaixo, com um iPhone 4S para comparar, qual é o tamanho das sacolinhas que o Extra estava fornecendo! Tenho certeza que não é coincidência, mas uma maneira de doutrinar o cliente sem ele perceber. Eu já sabia do tamanho dos saquinhos, porque o cliente à minha frente tinha questionado o tamanho. A resposta da patinadora foi de uma arrogância extrema, em tom quase ameaçador: “Nós temos apenas de fornecer alguma coisa para o senhor levar suas compras, e é isso que estamos fazendo.”
Virou guerra, aparentemente. E não deveria. A motivação do meio-ambiente é louvável, embora, como eu expliquei acima, a simples falta das sacolinhas não impedirá que lixo siga se acumulando nas nossas ruas e mesmo nos aterros sanitários. Mas uma contribuição por parte dos supermercados seria muito bem vinda, com ações educativas e o oferecimento de alternativas que não joguem todo o ônus da mudança nos ombros do consumidor. Porque fazer caridade com o bolso dos outros é muito fácil. Especialmente quando essa caridade vem acompanhada de um lucro extra de mais de sessenta milhões de reais.
Ainda quero ver quais serão os efeitos colaterais da decisão, que podem acabar sendo um tiro no pé. Afinal, compras de última hora, como de quem passaria no mercado após o trabalho e carregaria uma ou duas sacolinhas de compras na condução, tendem a diminuir. São compras pequenas, mas em grande quantidade. E há ainda as chamadas “compras de mês”, com grandes volumes, que não cabem nas alternativas que vão sobrar, como carrinhos de feira e sacolas retornáveis (aquelas que agora estão custando os olhos da cara). Isso sem falar em cenas bizarras, como alguém fazendo compras no Carrefour com uma sacola do Walmart, por exemplo, algo sem impacto algum, mas que vai gerar algumas fotos engraçadas.
Caro Alexandre,
Apreciei seu texto. Nossas opiniões são iguais e seus argumentos, que toarei emprestado, servirão como vitamina nas minhas acaloradas discussões com os “pseudos ecologicamente corretos” de plantão que defendem a proibição das sacolinhas.
Como morador da região de Jundiaí, fui um dos primeiros a experimentar essa nova onda. E foi terrível se acostumar, se é que posso dizer que me acostumei. Nem sempre tenho as benditas ecobegs por perto e posso afirmar que freqüento mais os supermercados do que o próprio quintal da minha casa. É um transtorno.
Tenho consciência ecológica, sim. Mantenho meu carro sempre regulado, separo o meu lixo para as cooperativas, minha esposa só lava a louça na máquina, que gasta menos água e energia ao contrário do que muita gente pensa, dentre outras atitudes que julgo que contribuem para o ambiente. Mas ficar sem as sacolas, é um absurdo. Passei a comprar sacos de lixo para descartar o que não pode ser reciclado pela cooperativa. Essa economia não foi repassada para o meu bolso.
Obrigado.
Luiz Carvalho
É, Luiz, a economia nunca é passada para o nosso bolso. Ao menos no caso da ecologia, ninguém nunca disse que ela é barata. E vai ficando cada vez mais cara a cada nova imposição que fazem. Mesmo os que já cumpriam determinadas imposições (o nosso caso), acabam pagando mais para fazer a mesma coisa. Triste isso, não?
Eu sempre vou no supermercado de mochila, sempre recuso sacolas então nem me afetou isso.
Quando eu era criança não se usava sacolas plásticas nos supermercados. Eram pacotes de papel. Garrafas de refrigerante levávamos na mão. Muitos dos produtos que hoje são oferecidos em embalagens plásticas eram embalados em pacotes de papelão como arroz, feijão. As caixas dos enlatados eram reaproveitadas para os clientes levarem suas compras para casa. Não existiam garrafas PET. Eram só garrafas de vidro retornáveis. Os nossos lixos eram predominantemente orgânicos.
Nesses 25 ou 30 anos a nossa produção de lixo cresceu exponencialmente. Estamos vivendo uma crise de produção de lixo. Não comportamos mais toda essa produção de toneladas e toneladas de lixo diário. E as eventuais soluções devem ser soluções em massa, não adianta pensar individualmente, não adianta falar em reciclagem como sinônimo de sustentabilidade, não é, a produção de lixo é muito maior que qualquer plano de reaproveitamento. A soluçao deve ser na raiz do problema, precisamos parar de consumir descartáveis. E os/as incomodados/as devem se sentir parte do problema, porque é de fato um problema de todxs nós.
Em lugares aparentemente antagônicos como Suíça e China não se usam descartáveis a menos que você pague. Na China os restaurantes populares não oferecem nem guardanapos. Os/as chineses/as estão acostumados/as e levam seus próprios…
Oi, Aline. Também sou do tempo dos sacos de papel e das sacolas grossas (ou de plástico grosso ou de um material que parecia corda, cujo nome não sei) para transportar as garrafas de vidro, tanto o vasilhame como as recém adquiridas. Exigia um planejamento prévio no caso das garrafas, mas para compras normais tinha-se os sacos de papel. Que, lembremos, foram substituídos pelas sacolinhas plásticas para uma “maior praticidade” ofecerida pelos supermercados, não a pedido dos clientes. Ainda acho que conscientização é a melhor solução, para que as pessoas deixem de usar qualquer coisa como descartável e, pior, depositando essas coisas em qualquer lugar. Quantas das pessoas que agora estão sendo forçadas a comprar sacolas retornáveis de fato vão começar a reciclar seu lixo? A maioria simplesmente está se adaptando a uma situação nova, que provavelmente está odiando, mas não vai estendê-la a nenhuma outra faceta de sua vida. Os supermercados? Esses já estão imaginando o que fazer com o lucro a mais tirado do nosso bolso (lembro de novo que as sacolinhas nunca foram gratuitas; seu preço esteve sempre embutido nos produtos, independentemente de você usá-las ou não, ao contrário do que ocorre na Suíça, Alemanha etc.), e ainda “pagando uma” de defensores da ecologia, o que eles estão muito longe de ser, como comprova uma boa olhada no setor de carga e descarga de qualquer estabelecimento.
Alexandre,
Pessoalmente eu fujo das sacolas plásticas como o diabo da cruz. Desde sempre busquei negá-las no supermercado, do contrário elas se acumulam em grande quantidade em casa, afinal não gero tanto lixo assim para usá-las.
Os supermercados claro que se deram bem com a história, se anteciparam a uma medida que poderia ser prevista em lei e de quebra ainda se justificam com a noção de que são “amigos do meio ambiente”.
Não partilho desse bom-mocismo do setor de supermercados, nem tão pouco acho válido pensar que temos de “lutar por sacolinhas”. Recomendo um texto que pra mim é por hora o mais lúcido sobre o tema.
http://www.outraspalavras.net/2012/02/06/aos-indignados-da-sacolinha/
O texto que você mandou, João, é sensato e bem menos xiita do que eu imaginava quando comecei a lê-lo — não concordo com tudo que está ali, mas mais concordo que discordo. E não chega a ir de encontro ao meu, porque o que eu aponto como problema são outras coisas. Não acho que temos de lutar pelas sacolinhas (necessariamente), mas, sim, para que o que os supermercados vão economizar não vá apenas para o bolso deles. Pode até ir uma parte, porque aí a colaboração seria efetivamente de todos, mas ir tudo? Um absurdo. Além disso, eu me sinto bastante incomodado por ser “punido” mesmo usando as sacolas quase que exclusivamente para o que elas deveriam ser usadas: carregar produtos do mercado para casa e depois usá-las para carregar o reciclável, muita coisa aqui em casa, da minha casa para a caçamba de reciclagem. E, se elas se acumulam, o excesso vai para a caçamba de reciclagem. Não sou perfeito nesse ponto, mas tenho a consciência de tentar fazer o melhor que eu posso. Eu e todos os outros que têm tal consciência acabamos punidos por causa de uma maioria (infelizmente) que não está nem aí para nada. E esse pessoal vai continuar sem dar a mínima para nada. Vão relutantemente adquirir suas sacolas retornáveis, caixas dobráveis e afins, mas seguir jogando lixo na rua, bitucas no chão, material reciclável no lixo comum…
É fácil, é só boicotar os mescados em que fazem essa palhaçada.
Sugestão: Zaffari do Bourbon Pompéia, lá não tem essa miguelagem;.
Vamos ver como o Záffari vai se comportar daqui a um mês, quando os supermercados voltarão a ser “amiguinhos” da ecologia, Mark.
sacolas recicláveis dadas pelo super é uma forma de amenizar esse problema. Mas a questão de salvar o planeta não se resume em atitudes que visem a reciclagem. Quem quer saber realmente o que agrava a situação do nosso planeta veja esse vídeo http://www.youtube.com/watch?v=lgmTfPzLl4E
Quer salvar o planeta, pare de achar que precisa de tudo que o comércio oferece. Viva uma vida simples, sem ser explorado pela idéia de consumo.
Olá Alexandre, eu tb estou revoltado com toda essa situação das sacolinhas! Excelente artigo, abraços amigo.
Obrigado pelo Elogio, Celso. Mas essa batalha acho que perdemos, infelizmente.
Essa semana vir uma coisa estranha no Extra da Rua Rego Freitas. Uma senhora estava levando 4 salsichas numa bandeja de isopor enrolado num filme plástico.
Para mim o que mais polui o meio ambiente é as embalagem agregadas a certos produtos.
É verdade, Ivair. E nem precisamos ir tão longe, com o exemplo do isopor. Mesmo o aparentemente inofensivo vidro de garrafas leva muito mais tempo para se decompor que o plástico das sacolinhas. Se não for reciclado e eventualmente quebrar-se, o dano ao ambiente será grande, porque os cacos não serão reciclados.
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Alexandre Giesbrecht nasceu em São Paulo, em abril de 1976, e mora no bairro do Bixiga. Publicitário formado pela Escola Superior de Propaganda e Marketing, é autor do livro São Paulo Campeão Brasileiro 1977 (edição do autor).